Que Mestres?
Penso no trabalho e no prazer. O que seria o trabalho sem prazer, ou o prazer sem o trabalho? Adoro as sextas feiras, dias de informal desencontro. Adoro ainda mais os sábados, depois das cinco, noite adentro caminhando sem subterfúgios. Essas eternas buscas começaram uma tarde, de tardinha quando olhei pro céu e lá estava ela, redonda e linda. Lembro de estar no colo de meu pai, quando fui invadida por uma sensação de inquietude e perguntei: que lugar é esse, estamos em que mundo? Que viemos fazer aqui? E o que é isso que vocês chamam vida? Ainda posso ouvi-lo respondendo sem responder, repetindo minha pergunta: Veja Maria, era assim que ele chamava minha mãe, veja o que ela pergunta. Como ele não queria mesmo responder, fiquei com as perguntas sempre à mão, quem sabe talvez a resposta aparecesse assim, de repente. A imagem daquela lua ficou marcando uma posição que eu nem podia imaginar. Descobri na análise, que depois desse dia não pude mais deixar de ser inteligente. De fazer perguntas inteligentes. Nenhum contrato teria sido obedecido com maior precisão.
Uma tarde, de tardinha, anos depois, achei a lua muito diferente. Ela era toda linda. Fiquei doida, como fico mesmo quando as coisas me importam. Tomada de muita ansiedade subi para a laje do banheiro de minha irmã e fiquei deitada no chão de cimento completamente fascinada. A lua brilha!!!! Meu Deus, a lua brilha. Que planeta é esse? É muito, muito bonito!!!
Meus irmãos quiseram saber o que eu fazia de tão extraordinário, ali deitada no chão suspirando. Pouco depois, estendemos os cobertores pelo telhado e ficamos todos suspirando. Apreciei e aprecio cada fase dessa lua de brilhante e vou pondo nomes, lua de feiticeira, de bolacha, escondidinha.
Durante anos, essa era uma história sem resposta. Como alguém pode ter chegado à adolescência sem saber que a lua brilha?
Quando pude me libertar do contrato paterno com a inteligência, fiquei flautando por aí, dando risada de coisas bem bobas e fazendo de bobos os inteligentes. A lua de brilho intenso que eu desconhecia, muito me ajudou a deslizar, a duvidar e depois a poder rejeitar os termos desse contrato.
Essa semana, no mundofreudiano, falava de como implicava com pessoas que exigiam que se aparentasse inteligência e como sempre respondia a essas demandas de conversas formais e sérias, com as maiores banalidades. Ainda dava os últimos risinhos quando senti aquele friozinho na espinha, sinal que algo de fantasmático acabava de ser tocado.
Meu Deus! Ocupavam o lugar paterno e eu respondia... pelo avesso!
Sair do olhar repressor de antigos Mestres não foi nada simples. Eu precisava daquelas reprimendas por não estar sendo inteligente o suficiente, e se eu não podia ser tão inteligente como o desejável, então deveria ser burra. Claro que encontrei nesses Mestres o que meu masoquismo necessitava. Como foi difícil abrir mão do papel, da posição definida pelo desejo deste Outro.
Fiquei perplexa! Mas que amídala que não acaba nunca.