quinta-feira, novembro 30, 2006

Por Mariana Magalhães(nº5)

Eduardo veio ao meu encontro: “Lembre que você tem que escrever...” Eu sei, Eduardo, estou dentro das regras... Um jogo? Eu nem sei... O que me causou a falta? Falta, é claro. O porquê da falta? Tentei me conformar porque imprevistos acontecem, ainda mais quando você depende dos outros para que isso aconteça. Ouvi de Conceição: “As pessoas sentiram a sua falta...” Ótimo, tenho contribuído para o grupo. Estou com uma dor de cabeça infernal, mas compromissos, regras são regras. Talvez não me estenda. Ficou em mim um vazio, eu não sei explicar... É como se o apaixonado tivesse faltado na minha paixão. Deixe-me explicar melhor. Não é o apaixonado, é o apaixonante, desculpem. Ato falho registrado. Estou apaixonada por isso que freqüento todas as quintas-feiras, e isso me faltou. Mas não enlouqueci, como as paixões antigas. A Confraria é uma das minhas paixões, e se assim não fosse...ah! Se assim não fosse...bye, bye para as regras, bye, bye as quintas-feiras, bye, bye meu pouco dinheiro despendido, iria sobrar mais... É engraçado estar cumprindo regras num momento de dor; é óbvio, regras doem... Eu não achei que sentiria isso... Vou finalizar, nem sei mais o que estou escrevendo porque a minha cabeça dói, estou gelada de frio e minhas mãos não estão sustentando mais a caneta...

Pôxa, retirem essa regra!!! É chato escrever assim.
Mariana Magalhães

quarta-feira, novembro 29, 2006

Por Potira Rocha(nº4)

Tirei a saia de flor, mas ainda quero ser um campo de girassóis. Quando no último mundofreudiano Marcos lembrou o movimento para o sol que essas flores fazem, fiquei me perguntando o quê, ou quem eu quero seguir. A primeira coisa que pensei: o meu desejo. Penso o desejo como um sol imenso, e o que fazer com os raios incontroláveis que iluminam tudo? Colocar uma cortina? Pensei também que nunca vi um campo de girassóis, mas sempre imaginei quão belo seria passear por um. Talvez seja isso, ser um campo de girassóis e passear por mim. Quão belo é passear por si!!! Contatos com o inconsciente que permitem esse passeio, penso eu. Mas se é tão belo porque assusta tanto? Será que é porque ainda se segue o sol? Acho, com toda certeza que existe no achar, que vou mesmo andar por aí vestida de flor. “ Se o que eu sou é também o que eu escolhi ser aceito a condição”. Potira Rocha

terça-feira, novembro 28, 2006

Por Conceição Nobre(nº4)

Um dia, já faz muito tempo, as crianças da família resolveram que as portas da casa poderiam ser fechadas. Descobrimos que não queríamos estranhos. Decidimos ficar apenas entre nós. Foi um tempo importante, nos olhamos, nos encontramos, nos amamos.

Depois desse dia, sempre soubemos que podemos nos encontrar e de alguma forma nos perdemos quando as portas se fecham. Podemos nos perder.

Este ano vou faltar ao encontro. Na verdade marquei outro encontro. Um encontro com as coisas que acredito, com os frutos do meu trabalho. Fiquei pensando que saio do particular, do doméstico e atravesso olhares desconhecidos. Desconforto! Mudança de posição.

Conceição Nobre

segunda-feira, novembro 27, 2006

Por Íris Ferraz(nº4)

Semana passada esqueci meu maiô no vestiário do clube depois da aula de natação, fiquei cismada, esquecer um maiô é demais! Geralmente sou muito esquecida, se levo alguma coisa “a mais” do que costumo, preciso redobrar minha atenção, pois será fácil esquecer em algum lugar. Hoje minha alergia voltou, senti minha resistência baixa, então lembrei que no dia da aula de natação, que esqueci o maiô, fui em outro horário e por isso o professor, que não me conhecia, pediu pra me ver nadando e fez o seguinte comentário: - está nadando muito bem, só falta resistência!

Mais uma vez, pensando em como esquecer um maiô, penso que ele é diferente de um biquíni. Um maiô é muito pano! É uma segunda pele; é algo “a mais” que sempre esqueço! Esquecer é despir destas vestes para o corpo ficar livre (no original leve – ato falho posterior). E como analista a resistência precisa faltar.

Iris Reis Ferraz.

domingo, novembro 26, 2006

Por Marcos Cândido(nº4)

Toda partida é uma separação. Faz alguns anos de minha vida que estou pra cima e pra baixo com uma mala na mão. A mala parece operar para mim como uma espécie de objeto transicional. Algo que parece ser a única presença constante, aquela presença que me ajuda a suportar, mais ou menos, cada partida.

Na mala levo objetos indispensáveis, - roupas, livros, meu computador, etc. Mas durante as viagens tenho sempre medo de perder as malas.

Falando, melhor dizendo, escrevendo sobre a perda – a separação – faz alguns dias que meu documento de identidade – my id – desapareceu. Parece que como resultado apareceu o Id. O incosciente, e com ele um sitoma histérico, uma dor insuportável na base da miha coluna.

Fui ao médico e nem tiun! Nem sinal da dor, mas ela está aí enquanto minha id esta desaparecida.

Marcos Cândido

sábado, novembro 25, 2006

Por Eduardo Sande(nº4)

Há uma dupla composição: 1) o quadro na sala de espera em que o garoto olha o belo corpo de mulher desnudo à sua frente; ela não olha para ele; no chão sobre uma almofada uma concha guarda seu buraco enquanto, ao lado, sobre o piso, uma corneta‑falo aparece como uma arma deposta; linda composição; 2) no encontro de filosofia e psicanálise, realizado a poucas semanas, um winicottiano fala da solução não freudiana encontrada por Winicott para a castração: o pai castrador não é uma ameaça, mas, necessidade, uma vez que sem este obstáculo e privado do instrumental necessário, o falo‑pênis‑corneta ereto, só haveria espaço para a frustração. Um Winicott com tempero lacaniano, penso!

Na cisão do eu, Freud defende que, diante da ameaça de castração, o sujeito encontra uma saída ‘esperta’: de um lado denega a castração, do outro, a aceita. A aceita, por ser privado de condições de ultrapassá‑la, eu diria. Os únicos falos com que podemos ultrapassá-la, neste momento, são as palavras, a simulação, a substituição sintomática, a sublimação. Diversas saídas. Retornar a este ponto em uma análise é perceber que aquilo que parecia saída é, em verdade, um beco sem saída. A única saída de um beco sem saída é retornar.

Uma cena do último verão: Estou no Souza, em Praia do Forte. Há um trio de belas portuguesas. Sou rapidamente informado pelo serviço secreto do lugar: chegam, se divertem, dançam, mas ninguém consegue, efetivamente, pegá‑las. Uma em especial me chama a atenção, captura meu olhar. Olho forte, e ela acusa o recebimento do golpe desejante. Esta cena fica congelada aí, como no quadro da sala de espera. Ela vai dançar só para mim; eu ficarei olhando, não por 10, 15 minutos, mas por algo como uma hora e meia. A cena acha‑se suspensa. Eu não me movo, ela também não. Eu bebo a cerveja e cada curva daquele belo corpo, cada movimento dos quadris, cada brilho daquele olhar. Não consigo, entretanto, sair do lugar. A situação pode parecer patética. Na verdade não é. Eu a tenho à mão, mas não posso mover as mãos e pegá‑la. Mas eu a tenho a tal ponto que nada a retira daquela cena. Outros homens tentam dançar com ela: nada. Uma de suas amigas reclama com ela: ‘O que ta fazendo aí? Caí fora!’. Nada. Tudo se passa como se eu e ela estivéssemos presos em suspensão em uma cena arcaica. Como a cena do quadro.

Há momentos em que há uma brecha e a suspensão pode ser quebrada. Certa vez, eu disparei: ‘Quando você chegou aqui, pensei: quero esta mulher. Pra que não sei, mas sei que quero’. Interpretação no ato da fala: pra que o menino do quadro quer aquela mulher, finalmente? Vai lá alguém saber. Mas ele quer. Seus olhos dizem sobre isso.

Eduardo Sande

sexta-feira, novembro 24, 2006

Por Mariana Magalhães(nº4)

Mais uma contribuição. Nem sei porque aceitei os papéis que a minha psicanalista me ofereceu. Engraçado, tinha os papéis, mas não a caneta. Corri atrás da caneta, mesmo sem saber o que estava com intenção de escrever. Mas ela me deu os papéis! E eu fui buscar a caneta! É assim que tem funcionado a psicanálise, o momento freudiano, minha vida agora, freudiana. Passei maus bocados esses dias, em crise, mas não uma crise propriamente dita, porque eu já tinha os papéis nas mãos, tinha também a caneta, mas não sabia como escrever. E aí tudo vira, revira e o me corpo começa a me cobrar: você não vai escrever?? Entendam, estou metaforizando! Que incrível, estou conseguindo metaforizar!! E o meu corpo cobrou-me novamente: se você não começar a escrever vou começar a enfraquecer... E eu o permiti. Vômitos, frio, enjôo, impaciência, choro contido... Ele foi respondendo, escrevendo por mim... “Olha, ela não está louca, está doente...” E eu permiti, mesmo estando lúcida, com papéis e caneta, mas não soube escrever durante esses últimos dias... Agora, sempre sábia e sensivelmente, minha psicanalista me doa os papéis, com o tem feito durante esses anos. Ela sabe que sei escrever sim e me emociono por sentir que é uma das poucas pessoas que conseguem entender a minha escrita, seja dita ou manuscrita. Não estou aqui por causa dela, mas pelos papéis que me foram oferecidos, pelas oportunidades pelas quais me deixei engajar, por estar buscando sentidos nos ditos e nos não-ditos. Por acreditar que sou capaz de vomitar coisas a me enriquecer e não a me congelar.

Mariana Magalhães

quinta-feira, novembro 23, 2006

Por Potira Rocha(nº3)

Um texto para o mundo. Um texto do meu mundo. Aquele mundo que venho descobrindo há 2 anos. O mundo que assusta e atrai ao mesmo tempo.

Jogo de esconder, jogo de pegar. Jogo do eu comigo mesma. Jogo “de mim” tentando matar minha mãe , a tirana , que faz parte do meu gozo.

Esquisito, mas gozo com tiranos. Esquisito nada.....é humano. É histérico colocar-se como objeto do outro. Masoquismo. Palavras soltas. Brain storm. Associação livre.

Sonho com bolsas, depois sonho com a morte da mãe (ou o inverso, não lembro agora)vivo minha sexualidade, ou tento. Passo pelo feminino para chegar ao feminino. Vivo minha sexualidade. Escrita flutuante, atenção do mesmo jeito.

Mão que segura o papel e outra que escreve. Mãe que inscreve. Eu que me deixo.

Potira Rocha

quarta-feira, novembro 22, 2006

Por Conceição Nobre(nº3)

Brincando de gritos
O grito de Renato ficou gritando em mim dias inteiros. Onde estarão gritando gritos? A arte ficou tão igual a outras artes que um dia, cansada de ser igual, gritou em garatujas. Freud explicou com tanto esmero sua teoria, que um dia Lacan gritou uma compreensão impossível. A Instituição de psicanálise foi tão manipuladora que um dia, gritamos o mundofreudiano. Os analistas foram tão distantes, tão engessados, que um dia aceitamos gritar o banquete. E por causa disso tudo naquele dia houve um grito. E ... meu ouvido ficou agoniado, porque gritos servem pra causar aflição, nos ouvidos, nas almas. Fiquei ouvindo outros gritos que há muito tempo não eram ouvidos pelas pessoas que estavam gritando. Então disse: ei, olhe... você está gritando! As pessoas gritam quando não sabem o que fazer com as palavras. As palavras quando ficam vazias voltam a ser rabiscos, barulhos, que é onde os poetas e os artistas vão buscar gritos, que se transformam em outras palavras, porque na verdade são gritos escondidos. Renato gritou, e o grito de Renato ficou gritando, chamando, convocando. Descobri que não era um grito surdo. O grito de Renato tinha muitas palavras. Cada uma brincava de levar a outra. E todo mundo ouviu as palavras que o grito de Renato gritou. E todo mundo ouviu quando elas dançaram, brincaram, disseram desaforos, se declararam, arrumaram e desarrumaram. Depois, cansadas fizeram sentido silêncio de gritos.
Conceição Nobre

terça-feira, novembro 21, 2006

Por Íris Ferraz(nº3)

Blitz Documentos

Sempre tive medo do inseguro, de burlar, desagradar, transgredir... medo de perder o controle ou a direção.

Semana passada entreguei a direção do meu carro a quem “pela lei de transito” não poderia”. O guarda mandou parar: - documentos do carro e habilitação, por favor. Resolvemos não comentar nada e entregar o documento com minha habilitação. Depois disso, o guarda estranhamente devolve tudo e deseja boa viagem.

Chego a minha análise contando a transgressão e me sentido menos responsável pela boa condução das coisas. Minha analista então diz: - mas precisou apresentar sua habilitação. Penso ½ segundo e digo: - não sem antes pedir pra ele regularizar a situação.

Iris Ferraz,13/07/06

segunda-feira, novembro 20, 2006

Por Marcos Cândido(nº3)

Estou pensando sobre a ética da Psicanálise. A ética do desejo. O desejo se diz, e dizendo meu desejo sigo desejando. Dizer o desejo e apenas uma forma de fazer o meu inconsciente circular. Isto não aprisiona o desejo mas o liberta do sintoma. Meu sintoma e perguntar ao outro o que ele quer de mim. As vezes tenho do outro. Tenho medo que ele diga que não me quer. E uma espécie de fobia obsessiva. E como se o fantasma me assombrasse porque ele pode me perguntar o que eu quero. Ao que normalmente ou quase sempre respondo, quero o que tu queres. Mas se ele não quiser nada de mim? Este e o meu fantasma, medo de ser desejado. Sem o desejo do outro fico perdido. Volto ao meu desejo de analista. Lambei-me agora de uma conversa que tive com um colega de escol, quando eu tinha mais ou menos. Acho a primeira vez que disse que queria ser psicanalista. Naquela época eu era um homem de cálculos, física, eletricidade, etc. Na verdade eu estava seguindo e desejo de meu pai. Ele dizia: Quero que você seja eletro-eletrônico. Também dia: De preferência que você seja militar. Naquele momento topei ser engenheiro mas já o havia desenganado quanto a possibilidade de eu ser militar. Ele também dizia que ia morrer eletrocutado. Já trabalhei isto na minha analise. Seja engenheiro elétrico, mas não seja se não você vai morrer eletrocutado. Registro violento da castração. Volto a minha questão com relação ao desejo do Outro. Afinal de contas o que queria meu pai. Continuo sem saber. Por mim, em meu nome, hoje posso dizer: - Quero ser analista. Por enquanto, penso que ser analista e dar conta do assassinato de meu pai.

Marcos Cândido

domingo, novembro 19, 2006

Por Eduardo Sande(nº3)

O tamanho do beco sem saída ou a próxima fase do videogame

Tenho trabalhado no Mundofreudiano...

A temática, em geral versa sobre um retorno e um atravessamento fantasmático. A companhia dos sintomas, o revival dos sintomas, parece dar a este percurso os requisitos de uma experiência com o inconsciente. O sujeito inventado procura se reinventar preservando algo que é da ordem do adquirido com labor, com trabalho. Trabalho de reinvenção que procura preservar o trabalho da aprender. Aprender a que? Aprender a fazer. Fazer no sintoma. Aprender a saber-fazer com seu sintoma para fazer fora dele o que se fazia no seu interior.

Tomemos um de seus aspectos mais apreensíveis: tornou‑se ‘bem cultural corrente’ todo um conjunto de penduricalhos a que recentemente vieram se somar às adições químicas, Viagra por exemplo, para dar suporte àquilo que no mundo animal pode ser acionado apenas por uma fêmea no cio. Filmes, roupas íntimas, chavões linguageiros, fantasias explicitas ou inconfessáveis. O sujeito do sexo sendo definido, determinado culturalmente, midiaticamente. A necessidade de uma prótese no lugar onde antes funcionava apenas um curto circuito, ou melhor, um circuito curto. Veja que com isso não descarto o valor de todos estes penduricalhos, que sob certos aspectos me parecem muito interessantes, mas, apenas, questiono o seu poder de despontencializar o sujeito de um saber fazer fora do seu sintoma. O grande sintoma que somos, cada um de nós.

Voltar à entrada do beco sem saída para, talvez, entrar no próximo requereria redimensionar a proibição do incesto reduzindo‑o ao seu aspecto real. Desnudando‑o de suas vestes imaginárias e simbólicas.

A invenção de uma nova erótica, eu penso, segue este paradigma.

Aonde venho trabalhando, na direção que venho trabalhando, parece‑me muitas vezes como a busca de uma situação mítica. A busca do Santo Graal, vagina ou útero materno, ganha a consistência de um outro circuito de gozo. Abandonar, por um lapso de tempo, as garantias culturais ocidentais para uma recuperação de uma potência arcaica. Abandonar Apolo em benefício de Dionísio. Sem os penduricalhos dos cultos dionisíacos.

Eduardo Sande

sábado, novembro 18, 2006

Por Mariana Magalhães(nº3)

Mais uma contribuição. A questão do ser canhoto, ou levogiro. Sempre ouvi: “essa menina faz tudo ao contrário!” ou “deixe que eu faço, essa sua mão toda torta...” ou “olhe só como ela abre a lata, olhe só com ela segura a vassoura, parece que não varre direito...” Enfim, saí com Liliana do último encontro e, como eu carregava um dicionário de bolso e por não nos lembrarmos da bendita palavra, fomos pesquisar os sinônimos de canhoto. Nem me atreveria a transcrever... palavras altamente preconceituosas, como o próprio Eduardo colocou ao me explicar o novo termo que até então desconhecia. Primeiro, quero ressaltar a incompetência dos autores de dicionários de bolso. Pesquisei na internet, procurando por canhoto, e nada. Também não sabia como escrevia. Bem, acho que isso não vem ao caso, o que importa no momento é que eu não sou mais CANHOTA ou ESQUERDINHA, com minha família costuma me chamar. Esquerdinha... kkkk. Esquerdinha também é algo altamente pejorativo e preconceituoso! Talvez por muito tempo eu tenha me sentido a verdadeira canhota. Ter me sentido não é o pior, o pior é ter absorvido e assumido essa posição contrária. Mas eu não tinha sessões de análise, e também não participava da Confraria dos Saberes! Essa coisa das palavras ditas e absorvidas, é muito louco. Hoje, com quase 3 anos de sessões de psicanálise eu tenho observado demais as palavras ditas. Meu vocabulário também não é lá muito extenso. Mas eu acho que sempre tive um quê de psicanalista, talvez. Isso sim tenho tentado absorver e tem me feito realmente bem, principalmente por ter certeza das coisas que busco neste momento da minha vida. Não vou me estender. O que tenho certeza agora é de que se eu não tivesse sido a canhota durante todo esse tempo, eu não estaria aqui compartilhando todos esses ricos momentos ou então abandonado minhas sessões. Eu tenho um sonho trabalhado em análise no qual aparecia um gato, dentro da casa de meus pais, até então a minha casa, arranhando a minha filha recém-nascida. Eu sou apaixonada por cachorros, mas tenho verdadeira admiração pelos gatos, mas não para criar. Assim, no sonho eu não queria maltratá-lo, ou algo assim, mesmo pelo que tinha feito. Aí eu cheguei a conclusão: vou colocar ele lá fora e alimentá-lo. Em sessão, cheguei a conclusão cabível no momento, mas sempre recordo esse sonho quando quero me livrar do que me impõem. Não sei se estou sendo clara. Mas estou freqüentemente colocando os gatos para fora de casa. Isso tem funcionado. Sempre relembro e repito pra mim mesma: deixe o gato do lado de fora.

Mariana Magalhães

Por Potira Rocha(nº2)

Após um longo período sem escrever para o mundofreudiano, retorno com uma questão: como deixar o inconsciente falar?

Tenho trabalhado isso em minha análise e tenho visto que ainda não encontrei a solução.

“Quem não fala vomita”, disse o analista. Na ultima sexta-feira passei muito mal, após vomitar bastante fui tomada de uma emoção, ou seja, lá que nome isso tenha, a ponto de chorar. Enquanto chorava, pensava no meu inconsciente e na analise que eu deixo estacionada. Pensei depois nas amídalas de Conceição, associação contraria, mas não menos coerente.

É, quem não fala vomita...

Potira Rocha

Por Conceição Nobre(nº2)

Aves de rapina

De repente um bem estar foi tomando conta do meu espírito. Que eu pense, o vôo das aves de rapina não atingiram o andar superior. Agora tudo se comporta como se fosse possível descrever o desvio das passagens. Na verdade soube através de minha irmã que meus avós sempre levavam uma criança no final de suas visitas. Como aves de rapina, aterrorizando com olhar perscrutador. Escondíamos-nos no último andar. Lembrei bem de nossas conversinhas, cochichos, risadas e medos histéricos.

A verdade sempre pela metade e só depois!

O andar superior era feito de risos e segredos. Ganhávamos quando a porta se fechava. Alívios.

Mitos que se formavam.

Medos que tinham nomes como fantasmas desvelados.

Nem as amídalas!

Conceição Nobre

Por Íris Ferraz(nº2)

Uma frase prende minha atenção! “- seu sorriso é lindo, brilha junto com o olhar”. Alguns dias antes estive pensando nisso. Sempre ouvi este tipo de elogio, com relação ao sorriso. Sorriso bonito me fazia parecer uma pessoa simpática, agradável. Mas, me perguntava esta semana, de onde vem este sorriso? Lembro do meu primo Alex, ele tem um sorriso lindo, mas dizem que vem do pai, o que me faz continuar a dúvida, pois se fosse da mão dele, era de minha tia e então seria um traço de família. Se não é, qual será a origem? Bom, se a frase inicial estiver certa, ele tem beleza porque tem haver com o brilho dos olhos. Olhos que são alma! Olhos que a família queria que fossem azuis como o de minha vó, já que nenhum dos oito filhos tiveram. O mesmo fizeram comigo em relação ao dom de desenha, meu pai é ótimo desenhista, meu tio também, então me encheram de tintas e papeis até meu irmão nascer e representar bem este “dom” familiar. Confesso que fiquei frustrada, desagradei a família por duas vezes, pois os meus olhos escureceram com o tempo, não sem antes manter uma cor que se assemelhava aos olhos do meu pai, meu irmão tinha o dom, eu os olhos. Mas, com mais tempo, também as pessoas pararam de dizer que meus olhos pareciam com o do meu pai perco a identificação com ele e fico feliz com meus olhos mais escuros, o que me faz produzir algo bastante particular; o sorriso cuja beleza está na identificação com a própria alma.

Iris Reis Ferraz 27/07/06

terça-feira, novembro 14, 2006

Por Marcos Cândido(nº2)

Gosto de resolver problemas. Acho até mesmo que os crio para poder resolvê-los. É como se algo em mim precisasse da excitação que o problema causa para poder acalmar-me. O problema me excita- (a)-c-alma.Penso que isto é uma forma de usar o nome do Outro para gozar, fazer. Fazer para o Outro. Ultimamente tenho tentado falar, fazer, desejar em nome próprio. Não fazer problema, gozar sem problema. De qualquer forma, esta forma do meu sintoma, me deu uma capacidade de fazer muito grande. Fazer o Axé, fazer dinheiro para sobreviver, fazer amigos, fazer texto e continuar fazendo sintomas. Continuar fazendo problemas. Neste instante, quando escrevi sobreviver, esta palavra fez problema. Desejo viver e não somente sobreviver. Segundo minha mãe, meu pai, e minha avó sobrevivi a morte. Daí acho que na vida fui sobrevivendo a morte. Uma espécie de sobrevida. Acho que começo a viver a vida. Acho que começo a gozar da vida, inclusive do que aprendi com os problemas que criei e resolvi. Acho que começo, neste sentido, a gozar do meu sintoma e aí viver como um santo homem. Tudo isto me faz pensar na questão do mestre e do psicanalista nos cursos da Confraria e no Mundofreudiano. Acho que estes são novos problemas para mim. Se sigo Lacan, parto do principio de que o mestre é um impostor necessário, um mal necessário. Ainda com Lacan descubro que ao significante mestre devemos a possibilidade de encontrar o espaço vazio. E graças ao Discurso do Psicanalista que a impostura, ou fato de o mestre e um impostor, pode ser realizado. Assim, pergunto: Seria o Mundofreudiano um espaço onde os mestres da Confraria podem fazer cargo de suas faltas e sua necessária condição de impostor nos cursos da Confraria?

Marcos Cândido

segunda-feira, novembro 13, 2006

Por Eduardo Sande(nº2)

No último banquete do Mundofreudiano fui pego pela surpresa. Um dos participantes trazia em seu discurso determinados conteúdos que pareciam, a mim, é evidente, apontar para o ‘Dom’ e a ‘Bondade’. Algo que seria da natureza do que gerou a intervenção de Liliana outro dia: ‘Mas nem em uma praia deserta se pode morrer em paz’. Intervi com um fragmento de entrevista inicial e logo depois com um fragmento de minha própria análise em que me dava conta de um determinado viés sádico que consistia em uma refinada tortura intelectual do outro, processo este que só se findava no momento em que provocava, neste, o choro. A surpresa foi constatar que esta confissão gerou, a seguir, quatro falas sucessivas que davam conta de situações idênticas. Ainda não consigo dar conta da amplitude deste acontecimento. De início, parece‑me que aponta para a retomada de algo que gerou uma certa filosofia do humano na teoria psicanalítica e que se perdeu em seu aburguesamento e institucionalização. Este é mais um encontro marcado. Encontro que o Mundofreudiano veste para mim com os trajes do inesperado.

Eduardo Sande, 08/08/06

domingo, novembro 12, 2006

Por Mariana Magalhães(nº2)

Mais uma contribuição. Estou num final de semana paradisíaco, relativamente perto de casa, no Riverside Hotel, achei que passaria mais algum dia na solidão do meu apartamento. Mas não poderia recusar a esse convite especial. Acabei de ler um trecho do livro dois das Brumas de Avalon, quando aparece: “... ela (Morgana) se sentia pouco à vontade, desajeitada. Ele gostaria dela? Seus seios pareciam flácidos e caídos, estavam assim desde o nascimento de Gwydion. Lembrava de que, quando o rapaz os tocara pela primeira vez, eram pequenos e firmes. Mas ele não parecia notar, acariciando-os, segurando os bicos entre os dedos e depois, suavemente, entre os lábios e os dentes...” Acabei lembrando da coisa do sexo, dinheiro e ... eu não lembro do último fator, Já ouvi num dos encontros que tudo para Freud se resumia à questão sexual do indivíduo, ou será que estou viajando nas discussões? Isso não importa agora. Porém me vem a quase certificação que esse item seja realmente de total relevância nas questões íntimas. A carência afetiva, a carência sexual é algo... (estou tentando utilizar palavras corretas, antes de ser mal interpretada). Essa coisa de dar nomes às coisas às vezes me coloca contra a parede. Estar só, num lindo lugar, por mais que eu admire todos os elementos naturais, como a lua, o rio, o cheiro do mato, sempre acabo me remetendo a pensamentos sexuais, companhia sexual. Não estou com a libido à flor da pele, mas... nada mal seria uma parceria nesse momento! Controlar extintos animais quando se é um ser racional... É mais fácil ser só animal.

Nem sei que data é hoje, é véspera de Páscoa, talvez reencontre a danada da solidão. Talvez eu precise me olhar mais no espelho e chamar pelo meu nome.

Mariana Magalhães

sábado, novembro 11, 2006

Por Potira Rocha(nº1)

Devo pagar algumas contas. Devo textos ao mundofreudiano. Devo ao meu inconsciente. Devo o andamento de minha análise. Devo, devo, devo, desejo...devo desejo?

Devo ser mulher. Devo ser pouco histérica. Devo ao feminino.

Desejo ser mulher. Desejo nada histérico. Desejo o feminino.

E entre todas as coisas que eu devo, o desejo está. Ainda que não pareça, ele está. Ele fica, ele tenta. E eu?Eu páro, estaciono, quase não desejo...

Potira Rocha

Por Conceição Nobre(nº1)

A cena se passa da seguinte maneira: estou com oito anos, moro no colégio interno e por algum motivo que não recordo, estou na casa de minha avó. Ela sai do banho, com os cabelos enrolados em uma toalha. Percebo algo diferente e pergunto: o que é isso que você passou nos cabelos? Ela responde: é álcool não está vendo? E eu prontamente retruco: agora acenda o fósforo.

Nos olhamos, nos encaramos, nos enfrentamos. Segurei firme, não fraquejei chorando quando ela reagiu com aquela conhecida violência surda, minuciosa. De volta ao colégio, adoeci muito seriamente, passei semanas com febre alta e precisei ser operada das amídalas.

Um detalhe interessante é que tenho sensação de morte quando tenho febre. Sempre achei que fosse devido a minha descendência índia.

Semana passada tive muita febre, a garganta totalmente prejudicada. Resolvi ir ao médico até pelo desconforto de faltar ao trabalho na semana de S. João. Ele me examina e diz: você está com amidalite. Não, respondo, não é possível. Não tenho amídalas. Ele retruca. Ficou um pedacinho e este pedacinho está inflamado.

Há algumas semanas decidimos escrever um texto sobre o mundo freudiano, para publicação. Sei perfeitamente que atravessaremos uma exposição sujeita a críticas, construtivas e destrutivas. Na verdade, trata-se de um enfrentamento. Aí está! Eis que minha avó está de volta.

O texto de Carlos Castagneda sobre os tiranos, foi durante anos, algo que me envolveu muito profundamente. Havia um ensinamento ao guerreiro de como enfrentar e acabar com um tirano. A certeza de que tiranos precisam ser totalmente derrotados. Assassinados! Pude trabalha-lo associando- à minha avó com bastante profundidade. O que venho, no entanto podendo deslizar o meu entendimento é o pedacinho de tirano que restou. Apesar de ter o mesmo resultado no meu corpo, fazendo-o adoecer, este pedacinho que sobrou não é de minha avó. Este é meu. Quando minha avó se foi, fruto de meu trabalho de análise, restaram os tiranos que eu mesma crio. Eis que minha avó está de volta mas vestida de mim.

Conceição Nobre

Por Íris Ferraz(nº1)

Yes! Nós temos fantasias, fantasias pra dar e vender… Estava no Capão no feriado. Em um momento falávamos do significado do “Amém”, disse que era “sim”, outra pessoa completa : “- sim, eu aceito”. Ultima terça-feira, aqui em salvador. Saindo do teatro vi tatuada nas costas de uma garota: “seja feita a vossa vontade. Amém.” Depois pensei, esta não é a ultima frase do “pai nosso”. Comecei a achar que estava escrito: “sim, eu aceito que você faça comigo o que é da sua vontade”. Para erotizar: “eu me disponho aos seus desejos, suas fantasias” “eu aceito ser seu objeto”. Voltando pra casa, dei uma opinião sobre um ex-marido que influencia a vida de uma ex-mulher (ele paga uma pensão e ela esconde sua vida sexual). Digo: então ela recebe pra não namorar. Depois sozinha, penso no oposto, as prostitutas que recebem para “dar*” (quantas formas de ser objeto, sem pudor e com pudor). Mas penso agora, que cisão. Lembro de uma história que escutei de uma amiga psicanalista. Em uma festa alguém enche sua paciência falando que o consultório de fulaninho só vive cheio, ele(a) só atende freiras. Ela, depois de muito responde: - eu só atendo quem trepa!!! A freira e a puta, o despudorado pudor e o pudor “desputorado”(belo ato falho). Quantas fantasias deixei de realizar? as românticas e as “sacanas”. Na faculdade de psicologia namorei alguém pelo despertar imaginário de uma fantasia romântica, antes na faculdade de música, pelo mesmo viés, uma fantasia erótica foi despertada pelo meu namorado, Gabriel, diabo tentador com nome de anjo. Talvez Gabriel aproxime essa cisão, já que associei seu nome ao anjo do inferno. Quem tem mais fantasia, a freira ou a puta? A freira fantasia, a puta atua!!!??? “Cá pra nós, casar-se todas com um único homem é fantasia pra meter inveja a qualquer puta”, “é desejar mais, ser objeto que a própria prostituta”. Mas se falo de mim, com qual posição me identifico mais? Sem dúvida, da puta. Afinal, assumir o desejo de, algumas vezes ser objeto é ser sujeito.

Íris Reis Ferraz

19/10/06

Por Marcos Cândido(nº1)

Abrindo o caderno

Cheguei em casa, comi demais. O sono foi embora e o Mundofreudiano se abriu...fala vazia.

Levantei, decidi então abrir um caderno e escrever. Abrir um caderno para o Mundofreudiano. Dar ao Mundofreudiano o que é do Mundofreudiano. Dar a minha análise o que é do meu Outro caderno. Eis o sentido de abrir um caderno para o Mundofreudiano. Nesta trilha pergunto-me se é possível fazer uma transferência com a psicanálise sem a presença de seu representante:

  • O suposto saber
  • O semblante de a
  • O Psicanalista

Na verdade pergunto quem e o OUTRO no Mundofreudiano se somos todos iguais? Ate as cadeiras, sinal da diferença, agora são todas iguais. “Somos todos iguais nesta noite...” Mas ate nesta musica, neste verso ha um Outro lugar de saber sobre nos. A Noite...

Escutei esta noite:

  • A proposta não e dialogar, não e discutir opinião...

Escutei esta noite:

  • A proposta e falar de si, e só de se fa –ler, já se fala de si na frente dos outros.

A dificuldade fraterna. Uma pedra no caminho do Mundofreudiano.

Pergunto-me: Será o Mundofreudiano uma proposta feita de pedras, ou seja, de irmãos? Será que o vinho substitui o leite materno? Será que o texto substitui a palavra do Pai?

Será que vinho faz metáfora do leite materno, e neste sentido nos permite uma transferência com a Psicanálise? Grafo com P maiusculo, ou será a letra P maiúscula de PAI.

Será que o vinho faz metáfora materna, e neste sentido libera o falaser para seguir afasicamente...

  • Oras repetindo?
  • Ora esquecendo o nome de objetos?
  • O ra desconhecendo objetos?
  • Ora, ora, ora..

Fiquei pensando sobre algo que disse:

  • A alfabetizacao dos meninos – a sala vazia;
  • Cadeiras escolares em uma sala que não deveria ter mestres

Somos todos iguais, sentamos em cadeiras iguais, mas alguns são analistas e outros não...eis uma primeira diferença. Será preciso supor que os analistas sabem mais sobre o Mundofreudiano que os não analistas?

Quais são as entidades/entes do Mundofreudiano? O que desejam? Que lugar ocupam? Onde esta o suposto saber?

Marcos Cândido

Por Eduardo Sande(nº1)

A pergunta que se segue nesta retomada de análise agora no sito do mundofreudiano é: qual o circuito e o significado de uma posição pré‑potente. Para resumir diria: isto remete ao meu esquema edípico. O importante é notar que a pré-potência opera. Quase como uma formação reativa. Você é capaz de fazer coisas a partir de uma aliança entre o simbólico e o real onde o imaginário manca. Ou, alternativamente, o imaginário passa a frente liberado das amarras do simbólico. Esse é o esquema da perversão. A tarefa parece ser suturar essas duas composições a partir de uma nova aliança entre real e imaginário na direção do simbólico. Isto tudo sem abrir mão das vantagens operacionais. Afinal, ninguém é besta!

Eduardo Sande

Por Mariana Magalhães (nº1)

Bem, resolvi contribuir com o grupo dessa vez, depois de conseguir relaxar com alguns cigarros que eu nem sei se é benéfico para o tempo de tratamento psiquiátrico ao qual tenho me submetido durante esses últimos sessenta dias, e confiando realmente na impessoalidade e sigilo que estão propostos aqui. Até porque já me certifiquei que falar, escrever, vindo de mim, só consigo fazer sobre mim. Aliás, tenho quase certeza de que Freud nada mais fez que escrever para ele, tentar resolver questões próprias, não tanto para resolver questões dos outros. Estou ouvindo Nando Reis agora. Bem, estou eu, o cigarro e a música e meus pensamentos tentando “contribuir para o grupo”, já que nada do que eu tenha feito nessa minha vida até hoje talvez não tenha contribuído para alguém, senão a mim mesma. Neste exato momento tenho duvidado da eficiência da psicanálise, apesar do meu legítimo interesse por ela. Mas a questão na qual me encontro agora é a solidão, e aí vem mil coisas na minha cabeça. Estou duvidando que quimicamente eu possa controlar os meus pensamentos só pelo uso de recaptadores de serotonina. Minha adorada psicanalista uma vez me disse que tenho mente de psicanalista, talvez pelos meus devaneios, minha sensibilidade de reconhecer algumas das minhas questões. Deixo claro , estou escrevendo sem pensar, com nos meus diários. Tenho ficado encantada com as informações que esse curso vem me trazendo, mas ao mesmo tempo tenho me cobrado muito a parte raciocinadora. Depois de ter descoberto que li e não consegui entender que Freud não era tão “romântico” quanto eu queria que ele fosse. O cara é um monstro, em todos os sentidos. A cabeça dele é um turbilhão de idéias, e interpretar ele é sim, muita loucura. Será que estou no lugar certo agora? A solidão é algo amedrontador para mim. E aí vem os melhores e piores pensamentos que um ser humano é capaz de pensar. Não vou ousar reler isso depois de terminar! Estou insegura. O pior, estou sozinha! Será que todo mundo precisa de um porto seguro, será que ter recaídas num processo desse que estou passando é permitido? E o que não é permitido? Essa coisa de se permitir é muito chocante, para outras pessoas. Penso que o que ele (Freud) fez foi se permitir mesmo, mesmo que ele tenha dito que deixou de se permitir por muitas vezes. Uma vez cheguei a pensar que as sessões de psicanálise poderiam ser feitas por cartas. Olhe eu transgredindo o pai da psicanálise. Tenho mil outras questões a colocar, mas escreveria um livro, portanto isso basta. Sem falar da desordem geral das idéias aqui colocadas. Minha mente está a mil por hora de novo.

P.S. Confio na minha psicanalista, por isso estou aqui, tentando me inserir em novos mundos, sejam lá simbólicos, imaginários e o mais difícil, o real.

Mariana Magalhães

quarta-feira, novembro 01, 2006

O mundofreudiano é a análise fora do divã (por Potira Rocha)

O mundo freudiano é a análise fora do divã. Cada um é analista e analisante, tratando de seu inconsciente a partir da provocação causada pela fala do outro. A principio é um tanto difícil falar de si em meio a tantos desconhecidos, mas os cortantes estão para ajudar a separar o que é seu do que é do outro. Com o passar do tempo a regra da associação livre vai se firmando e a fala fica cada vez “solta”. Instaura-se então o que rege a análise, falar o que vier a cabeça. Para os que nunca passaram pelo divã essa experiência pode levar a um processo analítico propriamente dito. Para quem já faz análise o mundo freudiano é mais um espaço para elaborar o que ficou suspenso dentro do set. Para os que já encerraram seu processo surge a oportunidade de desvelar os pontos cegos que ficaram lá atrás. Os textos trazidos pelos participantes retratam coisas do cotidiano, sonhos, sentimentos e muitas vezes os ecos de mundos freudianos anteriores. São fragmentos do inconsciente que se revelam e se transformam a cada encontro, formando um quebra-cabeça e construindo o que entendemos como sujeito. O mundo freudiano é um dispositivo formativo onde falar de si faz surgir questões referentes a prática analítica e a escuta de si mesmo possibilita o desvelar dessas questões.

O Vir(a)ser do Analista e o Mundofreudiano (por Marcos Candido)

É sobre o Mundo Freudiano como um novo e possível dispositivo de formação, garantia e autorização do analista, assim como vem sendo implementado na Confraria dos Saberes, que pretendo propor aqui uma reflexão critica e publica. Acima de tudo esta reflexão é um convite a todos aqueles implicados com a psicanálise, enquanto psicanalistas ou não, para que juntos possamos pensar novos caminhos para esta pratica de produção subjetiva para alem daquilo que tem se produzido na intimidade dos consultórios. Que a experiência da analise individual, vivida pelo par analista-analisando, foi e é fundamental para o desenvolvimento da psicanálise, tal como a conhecemos e a temos praticado ate agora, é indiscutível, contudo acreditamos que isto não seja mais suficiente para manter viva a própria psicanálise. Assim, manter as coisas como estão seria a sua morte, assim nos ensina o poeta: “A morte verdadeira é aquela que empurra para frente às coisas como estão dia apos dia, ano apos ano, fantasma de uma casa derrubada”. (Garuffi) Logo, com a experiência do Mundofreudiano, estamos buscando inserir um elemento que consideramos importante para os devires da psicanálise e dos analistas em devir. Mas que elemento este? Acreditamos ser importante que o analista possa dar prova publica de seu contato com o inconsciente, e neste sentido, garantir que esta prova possa ser reconhecida não só por um único analista, ou grupo de analistas identificados a priori por uma dada instituição, nos moldes já propostos por Lacan, o que define um modelo de autorização de cima pra baixo. Mas que este reconhecimento possa se dar de baixo para cima, através de uma experiência onde uma “fraternidade de analista” possa reconhecer-lhe a experiência de seu inconsciente, condição sem qual ele pode fazer cargo de seu desejo de analista. Assim, a experiência do Mundofreudiano, pode não somente propiciar uma “legalidade” na autorização do analista, mas também uma “legitimidade” deste diante de uma dada comunidade de analistas, que vive como fraternidade, não somente a experiência imaginaria do exercício do poder do mestre, mas da radicalidade do inconsciente em sua dimensão Real. Se vivemos com o Outro uma relação de extimidade, ou seja, o Outro é aquilo de mais intimamente estranho com o que convivo em mim mesmo, assim nos ensina Lacan, imaginamos que seria um ganho abrir aos outros as entranhas de nossas experiências inconscientes, ou seja, encontrar com este Outro publicamente, para que possamos efetivar na vida da comunidade psicanalítica esta idéia radical e tão cara a ética da psicanálise. Talvez seja esta a experiência radical que se passa no mundofreudiano, um encontro publico com o Outro. Isto e, no Mundofreudiano ha uma busca de que o analista em formação esteja ele no começo de seu percurso, seja ele iniciante ou praticante, possa dar prova publica de contato com as formações de seu inconsciente. Neste sentido, acredito que uma reflexão desta natureza seja de interesse da sociedade, na medida em que esta espera contar com uma pratica clinica que possa fazer um efeito de redução do sofrimento daqueles que chegam cotidianamente aos nossos divãs, e não ha outra maneira de garantir a efetividade deste efeito, se não garantindo que cada analista possa ter feito ele mesmo cargo de suas formações. Neste sentido, o Mundofreudiano nasce também de uma serie de questionamentos relativos ao funcionamento das instituições de psicanálise no que diz respeito ao processo de gestão destas e sua relação com a formação de novos analistas. Com o significante Mundofreudiano metaforiza-se a existência de um espaço, onde, os membros da Confraria dos Saberes, e os atuais participantes dos cursos por nos oferecidos se reúnem em nome do inconsciente com o desejo de falar diante uns dos outros de si próprios, e de ai, também estabelecer uma pratica de escuta analítica publica. Com esta experiência buscamos transduzir e transpor para este espaço publico, elementos da experiência de analítica como a associação livre de quem fala (ou a disposição de falar aquilo que vem a cabeça), a escuta flutuante do analista (ou a forma escutar sem se prender a um detalhe mas que permita ao analista deixar que seu próprio inconsciente entre em contato com inconsciente do analisando), a transferência (a transferência ou dispositivo inconsciente que permite ao analisando posicionar-se diante do analista como se este fosse aquilo que ele deseja, e que permite ao analista reconhecer e interpretar estar posições durante o percurso da analise), a interpretação (ou o ato de enunciar algo, ou nomear o desejo do analisando, ou cortar a sessão num momento dado, em nome do inconsciente), etc. Mas, por que fazer tal esforço de transdução e transposição dos elementos do set analítico para o Mundo Freudiano? Já não esta tudo garantido pelos dispositivos ate agora inventados? Em nossa perspectiva, seguindo a ética da própria psicanálise, alem não estar tudo inventado, entendemos que os dispositivos de formação vigentes criaram problemas que pedem novas soluções. Entre alguns dos problemas gostaria de refletir sobre a questão da mestria, algo que aludi em termos gerais na introdução deste artigo, ou seja: - Como possibilitar que o Discurso do analista, que e o reverso do Discurso do Mestre, possa fazer-se presente nos diferentes momentos da formação, e não somente na experiência da analise individual? Quando nos referimos ao Discurso do Analista, estamos falando de uma forma de estabelecimento do laço social, ou seja, uma ética e uma pratica que permite ao sujeito do inconsciente manifestar-se e ser reconhecido através da enunciação de seu desejo, ao qual ele procura reconhecer e dele fazer-se cargo, diminuindo assim seu sofrimento. Retomemos então a questão da formação do analista em sua relação com a experiência do Mundofreudiano. Em termos gerais, a problemática da “formação” do analista tem e sempre terá um grande valor para os devires da psicanálise e sua relação com a sociedade. Só para situar as dificuldades de lidar com esta questão poderíamos nos perguntar sobre as possíveis implicações daquilo que e dito por Lacan em um de seus discursos, e que aqui cito livremente: - Assim como não se formam santos, também não se formam analistas. No entanto, as instituições de psicanálise, novas e velhas, continuam oferecendo cursos de formação para analistas, dados por analistas que se consideram formados. Mesmo que muitas o façam sem necessariamente nomearem, e assim se responsabilizarem, por suas praticas formativas. Impressiona, por exemplo, que não tenha sido inventado para alem do termo formação, seguindo assim o convite e os caminhos abertos por Freud e Lacan, novos significantes e novas praticas para continuar falando sobre e teorizando o ato de vir(a)ser analista. Poderíamos ainda pensar nos diferentes problemas enfrentadas por Freud, quando da criação da IPA, quanto aos analistas que não eram médicos, ou mais tarde, quando os psicólogos de formação acadêmica também passaram a ser considerados legítimos herdeiros da invenção freudiana. Alias, ha não muito tempo atrás, quando comecei a enunciar meu desejo de analista, lá pelos idos de 1990, senti-me fortemente perseguido por este fantasma, já que não sou nem medico nem psicólogo. Ainda, ao alguns dias atrás, conversando com uma amiga italiana que e zoóloga e que tem muitos anos de analise, ela me relatou a mesma dificuldade e a recente proibição legal, na Itália, de que um sujeito possa exercer um pratica psicanalítica sem ser medico ou psicólogo. Neste sentido, acho que a questão do vir a ser analista e como isto se acontece em ato, e um fantasma a ser atravessado. Acredito que este fantasma se materializa em um sintoma, que e o de deixar-se invadir pela demanda social de que as instituições de psicanálise possam garantir uma formação acadêmica que referende o exercício da pratica analítica, e que como tal a sociedade exige que seja profissional. E mais ainda, como pratica profissional, que a analise seja avaliada e avalizada, se quisermos garantida, pelo bem que ela pode fazer na vida dos outros, na vida da sociedade. Isto e o reverso do fantasma da sociedade capitalista que quer pagar por serviços eficientes e não por charlatões. Eis a relação intrínseca, do meu ponto de vista, fantasmática, que existe entre a chamada “formação” do analista, e os mecanismos que normalmente tem garantido historicamente o funcionamento e a gestão das instituições de psicanálise que tendem a basear-se na existência de alguns mestres para produzir analistas competentes. Ha que se garantir a qualquer custo a qualidade do serviço, e para tanto os mestres a moda acadêmica tem que ter qualidade. Uma qualidade que lhe de um respaldo quer diante de seus discípulos, também pagantes, quer diante da sociedade em geral. Neste sentido, alguns psicanalistas, assim chamados datas, tendem a ocupar uma posição de mestria acadêmica exigida pela sociedade e demandada imaginariamente por seus discípulos. Enquanto que, quase sempre renunciam a posição real que deveriam ocupar, a do psicanalista, dentro das diferentes situações do processo formativa, assumindo ai uma posição de mestre de fato. Por isso, a meu ver os mecanismos ate agora inventados, com exceção da analise individual a que cada um de nos se submete, parecem andar na contramão desta. Neste sentido, eles parecem colocar o analista em uma forma normalizante, e normalmente concebida a imagem e semelhança de Freud e Lacan, mas sem exceção refletida a partir dos mestres que se constituem em cada instituição. Dito de outro jeito, quase sempre ha nos processos de formação, nas instituições de psicanálise, uma prevalência da encarnação imaginaria da figura de nossos grandes mestres, que afinal de contas só desejavam ser psicanalistas. Interpreto, e como se o simbólico, e, sobretudo dimensão real do vir(a)ser analista, e, portanto do desejo de analista, fosse reduzida tão somente a um jogo de espelhos. Neste sentido a formação parece se reduzir a um toque de trabalho forcado, algo da ordem de um trabalho obsessivo que pretende responder a relógio de ponto que vem estabelecer uma cronologia dos anos de analise e da quantidade de textos de lidos da obra dos mestres daquela escola, Freud, Lacan, etc. Em nossa experiência, na Confraria dos saberes, o Mundofreudiano tem promovido o devir do analista, enquanto um dispositivo que possa provocar um deslizamento entre o momento publico da formação acadêmica do analista e a experiência de analise, dando a experiência do inconsciente o lugar que de direito ela deve ter na formação do analista. Dai para aqueles que ainda não estão em analise o Mundofreudiano parece favorecer a construção de uma demanda de analise. Para os que estão em analise, ele parece intensificar o trabalho que vem sendo realizado na experiência individual. E para os que já são analistas, ele promove uma possibilidade de encontro destes com os pontos cegos deixados como restos de suas próprias analises. Neste sentido, o Mundofreudiano, pode ser uma garantia "pra que o sujeito diga

Não! A esse brincar-passar-de-anel da intersubjetividade, onde o desejo só se faz reconhecer por um instante para se perder num querer que e querer do outro”.(Lacan) Acreditamos que se o Discurso do Analista, no sentido que deu Lacan a esta expressão puder circular enquanto tal, como elemento ativador do inconsciente, pelo conjunto das situações formativas propostas pelas instituições de psicanálise, ai teríamos encontrado uma forma melhor de garantir que nos consultórios de psicanálise os analistas pudessem se virar melhor a partir da ética própria da psicanálise. Enquanto pensava sobre estas coisas encontrei esta citação de Lacan que parece refletir o que estamos buscando com a pratica do Mundofreudiano como dispositivo que pode proporcionar garantir a formação do analista comom vir(a)ser permanente: “O mundo freudiano, ou seja, o da nossa experiência comporta que é esse objeto, das Ding, enquanto o outro absoluto do sujeito, que se trata de reencontrar. Reencontramo-lo no Maximo como saudade. Não e ele que reencontramos, mas suas coordenadas de fazer, é nesse estado de ansiar por ele e de esperá-lo que será buscada, em nome do principio do prazer, a tensão ótima abaixo da qual não ha mais percepção nem esforço.” Logo, O Mundo Freudiano, nos parece uma forma de introduzir na formação do analista algo da ordem do Real.

Por Iris Reis Ferraz

No primeiro dia que participei do curso “Freud Percursos e Discursos”, o mundofreidiano logo marcou a diferença do estudo aqui na “Confraria dos Saberes” em relação aos outros lugares. O vinho, a interação do grupo, me fez pensar em Freud e as reuniões das quartas-feiras. O vinho me lembrava Baco e sabendo um pouco da história de como surgiu a idéia do mundofreudiano e também como aconteceu a Confraria, Baco fica mais atual. Baco ao tornar-se homem descobriu a cultura de extrair da uva seu precioso suco. Juno, porém, o tornou louco e fez com que ele vagasse por várias partes da terra. A loucura de Baco, portanto era ensinar aos povos por onde passava a cultivar a vinha. Bom, o medo é que sejamos tratados como loucos, os inadequados às instituições de psicanálise por descobrir a preciosa forma de utilizar o inconsciente na formação. Inconsciente, instancia tão falada e pouco utilizada, como oferecer uma formação de analista sem esta utilização e como utilizar de forma responsável? Os três pilares da formação: análise pessoal, formação teórica e supervisão. Será que eles funcionam separados? Assim, a teoria fica por conta das instituições e só deve se ocupar disso, o inconsciente e de responsabilidade da análise pessoal, se o inconsciente escapa, “leve pra sua análise”, só lá ele pode falar, sonhar, fantasiar e após passar para trás do divã o analisante se vê analista. Processo nada fácil, todas as instituições concordam, mas dizem também individual e de responsabilidade de cada um. Onde a análise é o principal, principal e individual porque parece que só lá é o lugar do inconsciente. O desafio parece ser aproximar os pilares da formação, o mundofreudiano vem agregar o inconsciente ao estudo da teoria. Se Freud descobriu a Psicanálise ao mesmo tempo que se descobria, como poderíamos negar as descobertas individuais que este estudo provoca em cada um em formação e como não auxiliar nesta transformação, uma vez que descobrimos como cultivar a vinha, mesmo que sejamos vistos como loucos!

Sobre o mundofreudiano(por Eduardo Sande)

Onde está Wally-analista? Uma experiência inovadora no campo da psicanálise No seminário ‘A ética da psicanálise’ o psicanalista francês Jacques Lacan encadeia, de maneira muito interessante, dois obstáculos que se puseram no caminho da teoria da psicanálise. Nos fala em um primeiro momento: “Jones nos diz ter recebido dessa pessoa a confidência de que, um dia, Freud lhe diz algo como isto – Depois de uns trinta anos de experiência e reflexão, continua havendo um ponto sobre o qual fico sem poder dar resposta, e que é – War will das Weib? O que quer uma mulher? Muito precisamente – O que ela deseja?”. Para arrematar algumas páginas depois: “Alguma coisa, certamente, deverá permanecer aberta no que se refere ao ponto que ocupamos na evolução da erótica e do tratamento a fornecer, não mais a fulano ou sicrano, mas à civilização e a seu mal estar. Deveremos talvez fazer o luto de toda e qualquer inovação efetiva no âmbito da ética – e até um certo ponto poder-se-ia dizer que algum sinal disso se encontra no fato de não fomos nem mesmo capazes, após todo nosso progresso teórico, de originar uma nova perversão”. A mulher incompreendida (poderíamos dizer: a histérica?) e o perverso que não se deixa reinventar. Ademais, a citação ao mal-estar da civilização. Poderíamos perguntar: se somos, os analistas, responsáveis pela direção da evolução da erótica, o que terá ocorrido ao nível de nossas instituições e de nossos dispositivos, de formação e garantia, obrigados a conviver com esses dois formidáveis sintomas: a histeria e a perversão? Estariam nossas instituições condenadas ao terrível círculo do pequeno poder que o desejo histérico e os jogos perversos estabelecem? Responder a essas perguntas pode ser tão mais importante quanto seja matéria que interessa para além das fronteiras de nosso campo. Jacques Lacan, importante psicanalista francês, foi mais longe que propor o relançamento das premissas freudianas. Tomou a seu cargo a tarefa de reinventar a clínica, a instituição e os dispositivos de formação-garantia estabelecidos pela Associação Internacional da Psicanálise (IPA), instituição de Sigmund Freud. No momento em que realizamos, nessa cidade, um movimento que caminha na direção de inovar, mais uma vez, esses mesmos dispositivos, cabe vir a público para convidar a comunidade a refletir conosco sobre esta experiência da maneira a que possa contribuir com a permanente análise que vimos realizando. Primeiro, pela importância que pode vir a ter para esta comunidade ter seu lócus de palco para o giro proposto, se este se mostrar profícuo. Depois, porque o paradigma ensaiado pode vir a se tornar um bom antídoto contra o círculo vicioso constituído de um lado pela falta de alternativa ao paradigma vigente e de outro pela proliferação de alternativas míticas mágicas que procuram, ingenuamente, desafiá lo. No lugar, entretanto, de discutir teoricamente os termos em movimento, optaremos por apresentar seu principal motor que vem a se constituir em um dispositivo a que chamamos ‘O mundo freudiano’. Pensamos que dessa forma convocamos o olhar diretamente para a prática que vem sendo desenvolvida. Certos de que aos espíritos argutos não escapará a teoria que esta requisita. Em poucas palavras: o mundo freudiano é um dispositivo em que se procura repetir em grupo o que se passa no set analítico. O pressuposto é que pessoas que atendem em psicanálise, que fazem sua análise ou que estudam psicanálise podem sustentar uma semiótica em que prevaleça a ética do desejo no lugar da ética do poder. As regras estabelecidas são simples: a) constitui se uma fraternidade em que se deixa, ao entrar, as diferenças de puro prestígio; b) institui se a abstinência em relação ao outro, ou seja, cada um só fala de seu próprio lugar e sobre si próprio; c) promovo se a produção textual, em que entre dois encontros pode se estabelecer como vínculo e como recolhimento de restos (lixo) as sobras do último mundo freudiano; d) instaura se o corte e seu correlato: a interpretação, como instante em que dois discursos se tangenciam e se desvelam e que, em grupo, se coloca como instrumento desvelador para todos os participantes. Estabelecida os princípios de funcionamento, que poderiam, com efeito, serem reduzidos a apenas um único: ‘aqui, no mundo freudiano, opera se tal como em uma análise’, resta estar atento para os efeitos que também são encontrados nesta, a saber: os efeitos transferenciais, as colagens imaginárias e os indesejados acting out e passagem ao ato. Nestes, alguns riscos incluídos, nenhum deles ausentes da prática clínica. Restaria perguntar: onde está o Wally-analista? Para tentar responder essa questão será primeiro preciso considerar que o mundo freudiano é freqüentado por pessoas com diferentes níveis de contato com a clínica. Desde aqueles que nunca fizeram análise até os que têm uma prática clínica de muitos anos. Logo o outro a quem se dirige a fala, o outro que pertence ao espaço lógico de cada um, apresenta se de diversas formas. O analista no mundo freudiano, poderíamos resumir, é um espectro fantasmático que pode tomar qualquer um como semblante. Ademias, considere se a possibilidade de que a ‘experiência do inconsciente’ de um é capaz de ‘contaminar’ àqueles que se encontram em ser redor. Afirmar isto, é acreditar que a experiência instalada por Freud tem a possibilidade de se instalada em uma comunidade por um processo de autopoesis gerar uma semiótica e dar lhe consistência e sustentação. Com isso, estaríamos em condições de responder de maneira favorável ao luto lacaniano de uma terapêutica para o mal estar da civilização. Iniciada desde fevereiro a experiência do mundo freudiano tem se mostrado fecunda. Assim como se diz que a análise não é para qualquer um, poderíamos dizer que o mundo freudiano não é também para todos. Alguns, principalmente, aqueles que ainda não tem um grande percurso de análise abandonam-no no momento em que o ‘inconsciente’ começa a operar de forma mais vigorosa. É possível verificar, como na análise, uma certa resistência ao dispositivo. A interferência silenciosa entre discursos, por outro lado, salta os olhos. Um discurso, apesar de sempre, por princípio, pessoal e não referenciado, parece partir de pontos de outros discursos ou de seus espaços lacunares. A experiência de corte e, ademais, uma experiência assistida, convoca para as escansões dos sujeitos. Para finalizar nossa análise desta experiência, restaria argüir sobre o futuro desta ilusão. Por que inventar em pleno começo de século XXI, novos dispositivos de formação, transmissão e garantia? Por que estabelecê lo fora da instituição? À primeira pergunta respondemos que ainda estamos carentes de um modelo de formação não iniciático. A ‘experiência do inconsciente’ fora do tradicional set analítico trará provavelmente novas questões e isto é muito bom. A leitura crítica possível em uma experiência dessa natureza torna, outrossim, os acontecimentos distantes dos ritos de iniciação baseados em uma fé. A transmissão da prática analítica e sua constante invenção não encontraram, por sua vez, até o momento, um dispositivo a altura de sua magnitude. Tradicionalmente, transmite se a teoria e a se imerge em uma prática que por efeito da própria imersão retira qualquer possibilidade de maior reflexão. A garantia à sociedade apregoada por Lacan na fundação da sua escola mostrou se sempre fictícia. Basta constatar que nenhuma das instituições de nossa cidade possui dispositivos de autorização e garantia em funcionamento. Sem estes nenhuma instituição é capaz de garantir nada a não ser uma incipiente proposta de reserva de mercado para seus próprios freqüentadores. Quanto à manutenção do dispositivo fora da instituição a resposta seria: estamos na expectativa de que ele crie seu próprio instituinte. Não conseguimos entender como as instituições de psicanálise podem continuar caudatárias do paradigma foucaltiano para as instituições, seja de segurança, de educação ou de saúde, a saber: hierarquias constituídas, baixo nível de liberdade e coesão coercitiva. Freud nos diz no início de seu texto de 1921 ‘Psicologia de grupo e análise do eu’: “Se uma psicologia – interessada em explorar as predisposições, os impulsos instituais, os motivos e os fins de um indivíduo até as suas ações e suas relações com aqueles que lhe são mais próximos – houvesse atingido completamente seu objetivo e esclarecido a totalidade dessas questões, com suas interconexões, defrontar se ia então subitamente com uma nova tarefa, que perante ela se estenderia incompleta. Seria obrigada a explicar o fato surpreendente de que, sob certa condição, esse indivíduo, a quem havia chegado a compreender, pensou, sentiu e agiu de maneira diferente daquela que seria esperada. Essa condição é a sua inclusão numa reunião de pessoas que adquiriu a característica de um ‘grupo psicológico’”. O mundo freudiano talvez venha a se constituir no meio de formalização de um ‘grupo psicanalítico’. Qual seria a distinção então que fazemos entre ‘grupo psicológico’ e ‘grupo psicanalítico’? Sintetizamos: imersos em uma semiótica freudiana, (ao contrário da imersão de um grupo social em que as identificações parecem jogar um papel fundamental), e convocados à exploração contínua do inconsciente e pelos efeitos que esta nos provoca, nos comportamos, no mundo freudiano, como um grupo de antropólogos: pesquisamos o que há de mais arcaico no humano. Só que no lugar de buscar em cavernas e desertos buscamos no interior de nossos universos psíquicos. Ainda, no lugar de promover qualquer tipo de emprobecedora retificação social promovemos uma enriquecedora viagem de retorno à matriz potencial inicial.